SOARES, Jô. As esganadas. São Paulo: Companhia das Letras, 2011. 262p.
Créditos: Folhapress
José Eugênio Soares, conhecido como Jô Soares, nasceu no Rio de Janeiro, em 1938. Um dos maiores humoristas e entrevistadores da televisão brasileira, também é romancista, tendo publicado vários livros, alguns deles best-sellers, como O Xângo de Baker Street e O homem que matou Getúlio Vargas, e no ano passado o mais recente deles: As esganadas, romance sobre um serial killer de mulheres gordas.
Ambientado na cidade do Rio de janeiro da época do Estado Novo, o romance conta a história de Caronte, um serial killer de gordinhas, cuja arma são apetitosos doces portugueses. Rejeitando o lugar comum de revelar o assassino apenas no final, o autor opta por apresentá-lo logo no início, bem como a sua motivação para os crimes, como ilustra o trecho a seguir:
“Um dia, Caronte vê uma gorda na rua lambendo um cone de sorvete. O rosto lindo lembra-lhe a mãe. Servindo-se da ponta da língua como um lagarto, a gorda desempenha movimentos ágeis e lascivos em torno da bola gelada. Com perícia, ela evita que as gotas escorram pelos dedos gorduchos. É quando Caronte percebe que jamais se livrará da mãe, a não ser que a mate sempre, sempre. Resolve assassiná-la novamente em cada gorda que encontrar. A partir de então, ele só vive para vê-la morrer. Começa a temporada de caça às gordas.” (p. 20-21)
Tendo como pano de fundo a memória do Rio da década de 30 do século XX, da política, do rádio e da publicidade, a história acompanha as andanças de quatro personagens que investigam pistas para elucidar o “caso das esganadas”. São eles o delegado Melo Noronha, o inspetor Valdir Calixto, o detetive português Tobias Esteves e a repórter e fotógrafa Diana de Souza.
Apesar da tensão dessa horripilante história de mulheres que literalmente morrem pela boca, é uma leitura envolvente, na qual você se delicia com as engraçadas situações vivenciadas pelos personagens, principalmente pelo quarteto que conjuntamente trabalha na busca do criminoso, das quais destaco a passagem a seguir:
“- [...]Minha mulher ficou tão assustada com o artigo da Diana n’O Cruzeiro, que começou a fazer dieta.
- Mas a dona Yolanda não é gorda – pondera Calixto.
- Toda mulher acha que é – filosofa Noronha.
- Ser gordo ou se achar gordo são duas coisas diferentes – afirma Tobias Esteves – Minha alcunha em Lisboa, juntos aos colegas da delegacia, era Gordo; no entanto, não me acho gordo.
- O senhor não é gordo, é só um pouco baixo pro seu peso – declara o diplomático Calixto.” (p. 107)
Se por um lado são macabras as imagens “desenhadas” por Caronte nas cenas do crime, por outro são hilárias as confusões provocadas pelas nuances e pelas sutis diferenças entre o português de lá e o de cá. Enfim, recomendo para todos e torço para que o caso d’As esganadas não demore muito a ganhar uma adaptação para o cinema.
*Elaborada por Gláucia Ventura como requisito para participação no Desafio Literário 2012, no tema Serial Killer (Opção 2). Abril de 2012.